A Maquinação
(A Maquinação da peça roda-dentada que liga à cambota)
Trabalho filosófico de Alexandre Cunha
Reflecti muito sobre a peça cuja forma é de uma roda dentada que vai ligar à cambota e que necessita de maquinação. É mais cómodo em termos de método de trabalho começar pela maquinação necessária para abrir o rasgo ou furo para o travão que liga as duas peças, mas é mais intuitivo começar a pensar no corte necessário para abrir o cone, sem antes demais passar pelo resumo de algumas medidas. Envio em anexo uma imagem de trabalho da peça original com medidas hyper-realistas.
Primeiro vamos então a um resumo de medições:
Uma boa notícia é que o rasgo para o travão na cambota tem 3mm de largura, o que quer dizer que se encontra bom aço inox a essa espessura, e melhor ainda, o aço inox com baixo carbono que é o mais frequente, por exemplo no Thomaz dos Santos, é também o mais indicado por ter maior tenacidade, pois é para aguentar pressões sem partir. Medi também dentro do rasgo, depois de perceber que aquilo tinha 4mm na parte mais funda, enchi o rasgo de silicone e fiquei com um molde onde confirmei as medidas e forma do rasgo, é um arco em que de ponta a ponta tem sensivelmente 12mm, embora eu goste de o medir ortogonalmente à vertical no solidworks para dar medidas exactas no fim, a diferença não vai ser muita, em que a abertura do arco é tangente a uma linha imaginária paralela a 4mm à aresta central ao rasgo também imaginária do cone da cambota. Faço elogios extremos aos Japoneses que trabalharam na cambota, vê-se realmente um excelente trabalho projectual e uma excelente mão-de-obra.
Sobre as medidas para a roda dentada, ela já tem um furo ao centro de 10mm, já encaixa na quase perfeição a entrar dentro da rosca da cambota, essa rosca é uma M10 mas tem sensivelmente menos 0,4mm de diâmetro o que provoca a sensação de que há folga, embora na realidade isso seja praticamente nula.
O cone terá de ser maquinado nessa peça a começar com um diâmetro de 14mm a 15mm de profundidade. O cone abre até a um diâmetro de 17mm. Para que tenhas noção do rasgo neste cone, ele tem 1mm de folga no topo e 2 no fundo, tendo o próprio rasgo 12mm, o que faz os 15mm de cone.
Será que o cone precisa de estar inteiramente dentro da peça? Perguntas tu e com boa razão, porque qualquer maquinação que se pudesse simplificar seria bastante melhor. Para simplificação e exactidão das medições e futuras maquinações, é bem melhor o cone estar todo na peça da roda dentada, isto porque o cone tem por exemplo 16mm de diâmetro a 5mm de profundidade, sim é assim tão exacto, os Japoneses trabalham muito bem, mas com esses tais 16mm não terias rosca suficiente para prender a peça. Esta maquinação em que todo o cone fica dentro da peça deixa uns 2mm da ponta da rosca a ver-se, e essa ponta nem rosca tem por ter um chamfer.
Prosseguindo com o pensamento sobre a maquinação, tal como disse na introdução faz mais sentido começar a interpretar o cone, embora depois na maquinação seja mais fácil fazer o rasgo primeiro. As ferramentas que tenho disponíveis não são as melhores, perfeito seria ter uma fresa em cone com o ângulo necessário. Avaliando então o que existe, a broca para metal maior que tenho tem 10mm High-Speed Steel (HSS), ora bolas, e a mais pequena, excluindo as de um ou menos de um milímetro por irem partir se fossem maquinadas nessa peça, é de 5mm HSS, ou seja, em termos de brocas normais não tenho nada que seja pertinente.
Tenho ainda a broca alargadora, que foi muita cara monetariamente, mas que já fez trabalhos magníficos, fará novamente sentido utilizar. Perguntas tu, e os rasgos dessa broca não são demasiado perto uns dos outros para fazer o cone? Não, cada escala da broca tem 5mm de profundidade já incluindo o cone de aproximação e 2mm de abertura de diâmetro, ou seja, está dentro do cone necessário. Supondo se tolere o cone de aproximação de cada degrau e pior ainda o degrau dos 12mm que será completamente desnecessário, após a utilização desta ferramenta, vão sobrar degraus necessários de maquinar. Penso que será melhor comprar uma broca HSS de 14mm e depois utilizar a alargadora para não haver tanto material a maquinar, dependendo de disponibilidade financeira.
Menos problemática é a maquinação do rasgo, a sua maquinação deverá ser feita antes do cone, e há que conceptualizar que o travão deverá entrar na cambota primeiro pela forma e profundidade do rasgo na cambota, será impossível que encaixe da roda dentada contra a cambota, portanto o travão terá de ser encaixado primeiro na cambota, e a roda dentada se encaixar contra o travão.
Se equacionarmos que não temos máquinas e fresas disponíveis, até em termos monetários, e que portanto é melhor contar com brocas, existem duas hipóteses de maquinação: ou se fura ortogonalmente contra o fundo da roda dentada, ou paralelo ao ângulo do cone contra o fundo da roda dentada. A primeira hipótese é a mais simples de fazer, e possivelmente até de ter um resultado de maquinsção mais consistente, contudo mecanicamente será menos pertinente do que a segunda hipótese. Por sua vez, a segunda hipótese terá de ter uma peça adicionar, talvez de madeira, para inclinar a peça para que a furação seja no ângulo paralelo ao lado cone. Para que haja material suficiente, terá de ser furada mais que uma vez, de fora para dentro, e poderei ter que comprar uma lima com tamanho semelhante ao rasgo para o acabamento.
Uma terceira hipótese tinha sido considerada pelo conjunto de pessoas que perfaz e é exclusivamente limitado por eu e tu, que era furar ortogonalmente perpendicular ao lado da roda dentada, mas excluo essa hipótese por deixar pouco material dentro do rasgo da cambota e a sua forma - primeiro a pressão de um parafuso contra o rasgo deixaria pouco material da rosca a fazer uma força com tanta importância, segundo a quantidade de material disponível para travar a rotação da roda dentada contra a cambota seria insuficiente, terceiro a força de aperto da porca na rosca da cambota, que trava a roda dentada contra a cambota nessa força axial, faria demasiada força contra um parafuso que estaria dentro de um rasgo circular, possivelmente entortando-o e/ou empurrando a peça para baixo caso houvesse milésimos de milímetro de folga.
Quanto a esta maquinação, tenho que comprar um broca de 3mm HSS, utilizando o instrumento que me emprestaste para fazer furações ortogonalmente direitas. Uma lima em paralelepípedo com espessura de 3mm será necessária para o acabamento do rasgo, e satisfaz a necessidade de ter uma lima rectangular pois a que tenho é cónica ou curva. Terei de verificar se existem brocas de 14mm e se existe disponibilidade financeira para aquisição. Farei prospecção de fresas que possam adicionar mais qualidade de trabalho e proporcionar um resultado mais satisfatório, seja na questão do rasgo, seja na questão do cone.
Quanto a máquinas disponíveis: já tenho um berbequim que satisfaz todas as necessidades de maquinação; o instrumento que me emprestaste para furação a direito; a tal broca alargadora de 4 a 20mm; uma lima cónica e uma curva ajudarão no acabamento do cone; várias gramagens de lixa também ajudarão no acabamento do cone; tenho madeira para fazer uma réplica do cone para ajudar a formar a peça da roda dentada à sua imagem; a mesma madeira serve para fazer uma cunha para inclinar a peça da roda dentada para fazer furações com o ângulo do cone; tenho as máquinas e ferramentas necessárias para maquinar a madeira; e por último tenho a mão-de-obra escrava que sou eu mesmo.
Será que a sociedade está preparada para a Maquinação? Penso que mais do que estar preparada, a sociedade quer a Maquinação. Aliás, a sociedade está menos preparada do que a vontade de querer a Maquinação por falta de ferramentas e disponibilidade financeira. Como um bom Português, há que desenrascar com o que temos sem gastar muito dinheiro, e que o resultado seja semelhante ao de ter muito dinheiro e ferramentas pela via do trabalho árduo d'A Maquinação.
Caldas da Rainha 07 de Dezembro de 2014
Alexandre Nunes Cunha